Museu de Arte Popular da Paraíba se destaca como um dos principais pontos culturais do Estado

27 de outubro de 2020

Renascendo um passado de glória em cada cordel escrito, música reverberada e peça produzida pelos artífices regionais, o Museu de Arte Popular da Paraíba (MAPP) da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) foi recebido efusivamente por Campina Grande, em junho de 2014. Pudera, afim à tradição, mas voltada aos arranha céus e vocacionada para o futuro, a Rainha da Borborema enxergou no MAPP as “afinidades eletivas” necessárias a uma relação de sucesso: a mesma inquietação, o passo apressado, a atenção às mudanças ocorridas no mundo, sem perder um instante do ciclo da história.

Guardião dos tesouros da Paraíba e testemunha atenta de seus costumes, o chamado “Museu dos Três Pandeiros” merece ser visitado com os olhos do coração. Nele está o dia a dia, a intimidade de povo nordestino, o que as pessoas daqui gostam de ouvir, utilizar, ler, suas brincadeiras, folguedos e paixões e, sobretudo, aquilo de que se orgulham em si mesmos, sua capacidade de trabalho e imaginação, resultando em uma obra ancestral, moderna e também imortal.

Todos os anos, é um evento aguardado em Campina a troca das exposições do MAPP. Elas acontecem usualmente antes do período junino, presenteando a cidade com uma atração a mais não só para os habitantes do município, mas para os turistas que vem ver o estrelado Maior São João do Mundo. Para isso, o time de curadores do Museu, Angelo Rafael, Chico Pereira, Fernando Moura, Sandrinho Dupan, Joseilda Diniz e Alfrânio de Brito procedem com várias reuniões com o objetivo de decidir os motes e artistas que estarão retratados três salas do MAPP, contemplando a Música, o Artesanato e o Cordel.

Assim, desde que foi aberto ao público, o MAPP passeou por diversas temáticas, a exemplo de “O Barro: De Adão ao Artesão”, “Naquele São João”, “Paraíba – Berço da Poesia Popular”, “Os Ramalho da Paraíba”, “Jackson é Pop”, entre outras, sendo que todas as exposições que por lá estiveram, trouxeram no esteio a essência da nordestinidade, tão conhecida em seus sotaques e narrativas, sabores e peculiaridades.

A seleção dos curadores a traduz por meio dos mais talentosos intérpretes, autores e artesãos, representantes máximos de um vasto e fecundo legado. Gente como Antônio Barros & Cecéu, Elba Ramalho, Manoel Monteiro, Toinho da Mulatinha, Lourdes Ramalho, Jackson do Pandeiro, Zé Ramalho, Zé Laurentino, Mestre Duduta, Marinês, Severino Medeiros, Biliu de Campina, as Ceguinhas de Campina Grande, Benedito do Rojão e Luiz Ramalho, homens e mulheres geniais que já foram laureados pelo Museu, seja nas exposições, seja com eventos, pela relevância de suas contribuições.

Pelo olhar apurado e sensível desses especialistas na cultura paraibana, as artes manuais, a musicalidade, a xilogravura e a cantoria, suas origens e miscigenações emergem e se misturam, dando mais tempero e densidade à formação da identidade brasileira. É o multiculturalismo do povo do Nordeste, a serviço dos saberes de uma nação repleta de ecos e influências. São objetos pessoais, documentos, depoimentos, escritos e milhares de canções catalogadas e disponíveis para audição, que integram um substancioso acervo informativo e multimídia. Acrescente-se a isso a inestimável colaboração da Biblioteca de Obras Raras Átila Almeida, considerada uma das maiores do mundo em se tratando de Cordel.

O Museu recebe bem e é bem recebido: desde a sua implantação, estima-se que 150 mil visitantes de todas as regiões do Brasil e do exterior nele estiveram. Apenas no que se refere à visita de escolas, por exemplo, a média anual é de 200 instituições. É que a junção do Ensino, da Pesquisa e da Extensão, confere ao MAPP múltiplas linguagens quando se fala em programação. Cursos abertos, encontros, palestras, espetáculos, lançamentos de livros, saraus, compõem um mosaico atraente de atividades, consagrando-o não apenas como centro de estudos e documentação das raízes regionais, mas como um lugar receptivo e de refinado entretenimento.

“Que toquem as trombetas, nasce um museu”
Quando as obras do MAPP foram concluídas, em dezembro de 2012, Campina estava em festa. Presente à solenidade, o poeta Manoel Monteiro inclusive declamou o poema de sua autoria “Que toquem as trombetas, nasce um museu”. Realmente, naquele contexto o MAPP nascia, contudo, ainda faltava muito para que despontasse de fato no mundo e estivesse apto à visitação.

E foi nesse sentido que o atual pró-reitor adjunto de Cultura da UEPB, professor Chico Pereira, recebeu a incumbência do reitor Rangel Junior para que o ambiente fosse dotado de um projeto museológico à altura de suas linhas arquitetônicas, desenhadas por um dos maiores artistas do século 21, Oscar Niemeyer [1907-2012].

Com um extenso currículo e ele mesmo artista plástico, Chico Pereira já dispunha de experiência no setor – foi o primeiro diretor, por exemplo, nos idos de 1969 a 1974, do Museu de Arte Assis Chateaubriand-MAAC, proveniente da antiga Universidade Regional do Nordeste (URNE). “A instalação do MAPP se deu em um período de dificuldade financeira na Instituição. O prédio estava pronto, mas precisava funcionar e ter atuado para a instalação dele foi sobremodo gratificante, pois hoje nós vemos o quanto ele é querido pela cidade, o quanto é abraçado pelos moradores do município e seus artistas.

Hoje, o Museu é o principal ponto de encontro da cultura campinense. A cidade se regozija com um patrimônio dessa natureza. Nesses mais de 50 anos da minha vida dedicados ao fazer intelectual e artístico na Paraíba, essa foi a minha mais bela experiência profissional e a minha mais bonita aventura”, disse.

Para o docente, tendo Rangel à frente da administração da UEPB, o MAPP consolidou suas práticas e embora atravessando invariavelmente fases difíceis, a Universidade cumpriu suas obrigações na preservação da memória cultural. “A UEPB não perdeu sua direção, manteve seu norte e desenvolveu uma quantidade gigantesca de ações que beneficiaram a comunidade. Eu me sinto muito feliz em ter participado dessa gestão. Nesses oito anos de UEPB não só pude ajudar, mas aprendi bastante, especialmente a superar momentos difíceis”, pontuou.

Museu Itinerante
Sucesso no MAPP, em Campina Grande, a exposição “Jackson é Pop”, que homenageia o centenário do “Rei do Ritmo”, ganhou sua versão itinerante e foi montada no Salão Negro do Congresso Nacional, em Brasília (DF), no ano passado. O material constava de 42 painéis, duas vitrines, tela para projeção de imagens e a edição de luxo de um catálogo contendo 52 páginas.

Mas não foi a primeira vez que celebrou-se o Museu em outra cidade. Já em 2017, o acervo do MAPP sobre Marinês esteve no Festival Rootstock de forró, sediado em Belo Horizonte, tendo como tema a Rainha do Xaxado. Discos de ouro, roupas e fotos estavam entre os artigos da cantora que integraram o Festival, considerado o maior no que se relaciona ao forró pé-de-serra nacional.

Ensino, Pesquisa e Extensão no Museu
As garças trazem calmaria ao Açude Velho, no MAPP a disposição das peças é perfeita – ao se visitar o Museu tudo parece funcionar tão bem e equilibradamente, que mal imaginamos os inúmeros mecanismos necessários ao seu bom funcionamento. Um dos mais importantes é, sem dúvida, o projeto de Extensão denominado “Informação e Interação no MAPP: Suporte de Atenção aos Visitantes”. A iniciativa é coordenada pela professora Cássia Lobão Assis e abrange estudantes de graduação da UEPB, oriundos das mais diversas áreas.

Em essência, o projeto, implantado em 2014, é voltado para o acolhimento daqueles que vão conhecer o Museu, e tem como componentes alunos de vários cursos, provenientes de várias áreas, a exemplo de Humanas, Exatas e Ciências da Natureza. O treinamento é sistemático, trazendo informações pertinentes ao acervo e também quanto à condução dos visitantes no local.

Identificados por fardamento com a logomarca do Museu, os bolsistas participam da atividade por meio de uma escala, elaborada por eles e a coordenadora. Assim, comparecem periodicamente ao MAPP por quatro horas diárias, dois dias na semana, com um plantão quinzenal aos finais de semana. O processo é regulamentado via Resolução UEPB/CONSEPE/004/2012, que dispõe sobre as condições de vínculo aos projetos de extensão na UEPB.

A aprendizagem é contínua e suplementar às práticas desenvolvidas em cada curso de graduação a que estão ligados os estudantes e fortalece o enorme alcance que possui o Museu, posto que ele congrega o estudo, a pesquisa e inúmeras outras facetas da Educação.

O Museu que enfeita
“Se Campina fosse uma moça, o MAPP seria um brinco muito brilhante”, diz a pedagoga Ana Lúcia Gomes, de 39 anos. Frequentadora assídua do Açude Velho, já que por lá caminha pelo menos três vezes durante a semana, ela explica que depois da construção do MAPP a calçada é outra, mais movimentada, segura, iluminada e bonita. “Esse prédio ganhou o meu apreço. É como um presente para a cidade”, endossa.

A parte de baixo do Museu é completamente aproveitada pelos moradores da Rainha da Borborema. Quando não está recebendo exposições ao ar livre ou sediando projetos do próprio MAPP, o espaço é ponto de reunião para grupos de Hip Hop, Break e de esportes em geral.

Os arquitetos e coautores do projeto do MAPP, junto com Niemeyer, Cydno Silveira e Luís Marçal, em carta que compõe o memorial do Museu, apontam que sabiam perfeitamente da importância do Açude e de como ele está vinculado à história de Campina e da região, incontestavelmente a principal referência paisagística da cidade. “Com uma obra de Niemeyer é bem fácil se tornar uma paisagem forte de referência nacional. Assim aconteceu em Niterói e em seguida em Curitiba com os seus museus, também esculpidos por Oscar e que hoje fazem parte do patrimônio da cultura internacional”, enfatizam na missiva histórica.

A epístola conta, ainda, que o Museu deve ser um marco a separar uma nova mentalidade cultural urbanística da cidade. “Não só pela sua arquitetura e engenharia de instigante imagem, mas pelo surgimento na paisagem de algo diferente, impossível de ser imaginar, mesmo nas cabeças mais evoluídas, porque se trata de uma rara beleza resultante da junção da técnica e da arte. Importante é que além da beleza da obra de concreto e vidro, o conjunto edificado atingirá a sensibilidade do povo paraibano e dará ao Açude Velho uma obra digna, bela e instigante”, afirmam.

Texto: Oziella Inocêncio
Fotos: Codecom
UEPB